Quando o escritor britânico George Orwell sentou em sua cadeira para escrever sua obra-prima, imaginou um catastrófico cenário futurista em que uma espécie de mescla fascista-socialista dominaria o mundo, suprimindo liberdades civis e até mesmo cortando pela raiz o pensamento crítico das pessoas. Todo canto do planeta era vigiado pelas câmeras do governo, os olhos do hipotético ditador Grande Irmão (Big Brother, para os íntimos), que aliás emitia ordens à população assim que achasse necessário. Enfim, uma espécie Pedro Bial sem aquela filosofia toda.
Nesse mundo catastrófico, o Ministério da Paz promovia a Guerra, o Ministério da Fartura rateava parcamente rações para a população enquanto o Ministério da Verdade nada mais fazia do que reescrever páginas de jornais e revistas antigas de modo a alterar a História e mostrar como tudo que acontece é ótimo (por exemplo, "a ração de 200 gramas de arroz aumentou para 300 gramas", sendo que na realidade há um mês a cota era de 400 gramas).
Orwell foi brilhante, mas errou num detalhe. Chutou um ano qualquer para o título de seu livro e eternizou o ano de 1984. Mal sabia ele que se escolhesse 1985 acertaria o ano em que uma espécie de ministro da Verdade herdaria a presidência de um país por aí, desses que saiam de uma Ditadura Militar.
José Sarney parece necessitar dos serviços do Ministério da Verdade para validar algumas declarações recentes. Para o senador, não havia necessidade de exibir fotos da época do impeachment de Fernando Collor quando de sua queda do poder em 1992 na galeria de fotos da história do Senado. "Não é marcante" comentou, talvez em um mesmo tom em que vociferaria "Ninguém aqui sabe de ato secreto" em uma daquelas câmeras/microfone espalhadas pelo país fictício de Orwell.
Agora, o maranhense defende que documentos estatais secretos assim permaneçam por toda a eternidade. "Não podemos fazer Wikileaks da história do Brasil", afirma ele, sob o argumento que a atitude poderia abrir feridas diplomáticas.
Sarney é o homem do partido da Ditadura que foi eleito como primeiro presidente civil pós-Ditadura. O homem que institui o congelamento dos preços para que os preços não subissem. O homem do Maranhão que foi eleito senador pelo Amapá.
Pois é. Ele reinventou o Ministério da Verdade.
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